domingo, 24 de agosto de 2014

O lado saudável da selfie


Ultimamente tenho percebido uma certa preocupação com a superexposição através do aumento significativo das postagens de selfies. Muitos me perguntam até que ponto postar selfies pode ser um comportamento narcisista e doentio. 

Antes de entrarmos especificamente nessa questão devemos lembrar que nós, humanos, somos seres de sociedade. Isso significa que gostamos de nos relacionar com nossos semelhantes, de olhar e de ser olhado, de trocar ideias, impressões e opiniões. No fundo o sujeito quer ser amado e admirado por algo que ele acredita que faz bem ou que tem de bom. E não há nada de errado nisso.

Vale lembrar que o olhar do outro, ou seja, a maneira como o outro nos vê é uma referência de construção de identidade. Raramente temos a oportunidade de ver a nós mesmos, a não ser através do reflexo de um espelho, das lentes de uma câmera ou pelo olhar do outro, que nos dá um feedback sobre como estamos e como nos apresentamos ao mundo. Olhar para fora é muito mais fácil do que olhar para dentro; afinal é mais fácil falar do outro do que de si mesmo, não é verdade? Em entrevistas de emprego isso fica muito claro e tem gente que passa horas treinando em frente ao espelho para não cair numa saia justa.

Nesse caso, a selfie presta um grande serviço porque faz com que o sujeito se olhe e se questione também. Vale ressaltar que nem todo questionamento é uma crítica. Além disso, a crítica também pode ser "do bem" desde que seja construtiva. 

Outro aspecto interessante da selfie é que ela permite ao sujeito tirar quantas fotos quiser. Caso não goste do que viu, ele apaga e recomeça. Ele também pode brincar com sua própria imagem através da edição e da colocação de filtros, dando asas à sua imaginação. Isso pode ser uma atividade divertida que auxilia o sujeito a entrar em contato consigo mesmo e expressar ideias, opiniões, construir a sua própria história e interagir com os outros, visto que a diferença entre a selfie e uma fotografia comum é que a selfie é feita para ser compartilhada nas redes sociais. 

Quanto ao excesso de postagens de selfies que tanto preocupa atualmente, penso que tudo o que é novidade causa um certo encanto. Com isso, a tendência é usar e abusar até cair no corriqueiro, perder a graça e ser trocado por outra coisa "mais interessante". É claro que há casos extremos, de pessoas que se deixam levar por essa atividade a ponto de denegrir sua própria imagem, prejudicar seu cotidiano, suas relações sociais e seu trabalho, além de comprometer seus registros de memória ao prestar mais atenção na selfie perfeita do que no momento vivido. A boa notícia é que esses são casos isolados e não representam a maioria. 

Portanto, desde que se tenha bom-senso e cuidado com a própria imagem, evitando excessos e exposição inadequada tanto de si quanto do outro, o lado saudável da selfie permite ao sujeito construir e compartilhar sua própria história. Com o passar do tempo as pessoas mudam tanto física quanto emocionalmente. Olhar para trás faz com que o sujeito reveja a si mesmo, sua forma de expressão e suas opiniões passadas. Isso pode ser enriquecedor para a reavaliação da própria história e a selfie se presta bem a isso. Afinal, no fundo somos uma metamorfose ambulante. E Raulzito já sabia disso.